terça-feira, 9 de agosto de 2011

andaimes pingentes


dos que tivemos notícia, hoje foram nove em salvador.
por ano são mais de três mil em todo o país, que acabam no chão como um pacote tímido.

o jornal baiano anuncia um 'acidente'.
mas a primeira definição do dicionário contraria a notícia da publicação:
"substantivo masculino (do latim accidente) 1. O que é casual, fortuito, imprevisto".

a morte ali era anunciada.
quantos cabras marcados para morrer por condições de trabalho inseguras, sem treinamento ou instrumentos adequados?
a morte-de-repente sai no jornal. agride, revolta.
embota os olhos de cimento e lágrima.

cinicamente a morte-homeopática - pela terceirização, pelas jornadas de trabalho extenuantes, pelos salários baixos, pelo ataque aos direitos e pela precarização e banalização da vida - essa morte, a morte-aos-poucos é vendida por eles como a prova de um país que cresce em emprego e renda.

sim, sacrificados em prego.
sim, a renda do lenço da viúva.

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mas das bases carcomidas dessa construção,
surgem as fraturas do edifício, cada vez mais expostas em passeio público.
irão implodir?

"se eu construo, eu destruo".
é tempo, então, de demolir.

basta dessa construção que nos trata como máquinas!
é preciso demolir e, em seu lugar, colocar de pé nossas paredes sólidas - tijolo por tijolo num desenho mágico e lógico.

dos escombros dessa vida há de surgir uma outra, projetada por nosostros.
neste belo concreto, flutuaremos no ar como pássaros e descansaremos como se sempre fosse sábado.

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mas hoje, por ora, enquanto o prédio ainda se mantém de pé e andamos pelos andaimes-pingentes-que-a-gente-tem-que-cair, choro e escrevo por estes nove filhos da classe operária como se fossem os últimos:

antônio reis do carmo (armador)
antônio elias da silva (carpinteiro)
antônio luis alves dos reis (carpinteiro)
elio sampaio (pedreiro)
josé roque dos santos (pedreiro)
jairo de almeira correia (ajudante prático)
lourival ferreira (armador)
martinho fernandes dos santos (carpinteiro)
manoel bispo pereira (ajudante prático)

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pela fumaça e desgraça que a gente tem que tossir, pelas moscas bicheiras a nos beijar e cuspir, vocês hão de nos pagar.
pelos nove de hoje e pelos milhões que tombam todos os dias como pacotes flácidos, lutamos pela paz derradeira que enfim vai nos redimir.

e ela virá, dos escombros dessa construção insólita.

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